Oito ministros votaram a favor da descriminalização da interrupção da gravidez em caso de anencefalia; dois ministros foram contra
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a mulher tem direito a  escolher interromper gestação de feto anencéfalo. A decisão foi tomada  pelo placar de 8 votos a favor contra 1 desfavorável à ação movida pela  Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS), que defende a  interrupção da gravidez nesses casos. 
Os nove ministros favoráveis acompanharam a tese do relator, Marco  Aurélio Mello, que entende que a mulher que optar pelo fim da gestação  de bebê anencéfalo (sem cérebro) pode fazê-lo sem ser tipificado como  aborto ilegal. Até então, a legislação permite o aborto somente em caso  de estupro ou risco à saúde da grávida. Fora dessas situações, a mulher  pode ser condenada de um a três anos de prisão e o médico, de um a  quatro anos. Nos últimos anos, mulheres tiveram de recorrer a ordens  judiciais para interromper esse tipo de gestação.
Além do relator Marco Aurélio Mello, votaram a favor os ministros  Rosa Weber, Joaquim Barbosa, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Carlos Ayres Brito,  Gilmar Mendes e Celso de Mello. Os contrários foram Ricardo Lewandowski  e Cézar Peluso que alegaram que a permissão nesses casos poderia servir  para a interrupção de gestações de fetos com outras doenças com poucas  chances de sobrevivência.
O ministro salientou que nenhuma mulher será obrigada a interromper a  gravidez se estiver gerando um feto anencéfalo mas, não se pode levar  às últimas consequências esse martírio contra a vontade da mulher, pois  isso corresponde à tortura, ao tratamento cruel.
 Na sequência votou Gilmar Mendes. Ele lembrou que desde 1940 (com a  edição do Código Penal), a sociedade brasileira convive com a  descriminalização do aborto em casos de estupro e de risco à saúde da  mãe. Por isso, em sua opinião, a possibilidade de aborto de fetos  anencéfalos está autorizada desde então, tendo em vista que,  comprovadamente, gestação nesses casos traz graves riscos à saúde da  gestante. “O aborto de fetos anencéfalos está certamente compreendido,  parece-me, entre as duas excludentes da ilicitude, já previstas no  Código Penal. Todavia, era inimaginável para o legislador de 1940 prever  essa circunstância, em razão das próprias limitações tecnológicas  existentes”, afirmou.
Neste momento, quem vota é o ministro Cezar Peluso. Antes dele, o  último a votar foi ministro Celso de Mello. O ministro Dias Toffoli foi  impedido de votar porque, quando era advogado-geral da União, se  manifestou publicamente a favor da liberação.
Clima
       Foto: STF / Divulgação Ampliar   
Julgamento teve início na quarta-feira com a presença de representantes civis e religiosos no STF
O segundo dia de julgamento foi de traquilidade nos arredores  do Supremo. A vigília de religiosos contrários ao aborto de anencéfalos,  que começou na terça-feira, praticamente se dissipou durante o dia de  hoje. Do protesto, que até ontem reuniu católicos, evangélicos e  espíritas na Praça dos Três Poderes, restaram apenas algumas poucas  faixas, penduradas sobre a grade de ferro em torno do prédio principal  do Supremo Tribunal Federal.
No fim desta tarde, com o julgamente praticamente definido, o único  manifestante apoiado sobre a cerca era o professor Arael Magnus, de 61  anos. "Vim protestar e vou continuar protestando contra este genocídio  localizado", afirma Magnus, que ostentava uma folha de papel onde se  lia: "Aborto: Ainda bem que sua mãe não pensou nisso". "A decisão do  Supremo não altera em nada, porque esta é uma manifestação conceitual. A  vida é um bem divino, e só com a intervenção divina ela pode ser  interrompida", concluiu.
Primeiro dia 
O primeiro ministro a votar na quarta-feira foi o relator do caso.  Após mais de uma hora de leitura, o ministro Marco Aurélio Mello deu seu  voto favorável ressaltando que "o anencéfalo jamais se tornará uma  pessoa". "Cabe à mulher, e não ao Estado, sopesar valores e sentimentos  de ordem privada, para deliberar pela interrupção, ou não, da gravidez”,  afirmou o relator durante o voto.
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Terminada a leitura do relator, o julgamento foi interrompido para o  almoço e os trabalhos foram retomados pouco antes das 15h. Então foi a  vez da ministra Rosa Weber dar seu vota. Após uma longa sustentação  sobre o direito à vida dos fetos que nascem sem cérebro, a ministra  ressaltou o respeito da prevalência da vontade da mulher.
“A incolumidade física do feto anencéfalo que, se sobreviver ao  parto, o será por poucas horas ou dias, não pode ser preservada a  qualquer custo, em detrimento dos direitos básicos da mulher”, afirmou  antes de concluir pela procedência da ação. Na sequência, os ministro  Luiz Fux, Joaquim Barbosa e Carmen Lúcia acompanharam o voto dos colegas  e defenderam a escolha da mulher de interromper a gestação.
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A ação foi movida pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na  Saúde (CNTS), que defende a liberdade de escolha sobre a interrupção da  gestação nos casos em que o feto tem má-formação no cérebro e nescerá  sem expectativa de sobrevida. Entidades religiosas e em defesa da vida  são contra.
 Você é contra ou a favor da antecipação terapêutica de parto nos casos em que os fetos apresentem anencefalia?
Histórico
Em 2004, o relator da ação, ministro Marco Aurélio concedeu uma  liminar autorizando a antecipação do parto para gestantes que assim  decidissem, quando a anencefalia fosse identificada por meio de laudo  médico. À época, o ministro afirmou ainda que, “diante de uma deformação  irreversível do feto, há de se lançar mão dos avanços médicos  tecnológicos, postos à disposição da humanidade não para simples  inserção, no dia a dia, de sentimentos mórbidos, mas, justamente, para  fazê-los cessar”.
Pouco mais de três meses depois, o Plenário do STF decidiu, por  maioria de votos, cassar a liminar concedida pelo relator. A discussão,  bastante controversa, foi tema de audiência pública no STF. Foram  ouvidas 25 diferentes instituições, além de ministros de Estado e  cientistas, entre outros, cujos argumentos servem de subsídio para a  análise do caso por parte dos ministros do STF.
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